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O Parlamento Europeu aprovou no passado mês de março a lei que regulamenta o uso da Inteligência Artificial (IA). Esta legislação surge num momento crítico, mas mais crítica será a sua implementação num ecossistema de inovação complexo onde o ser humano deve estar no centro da discussão

A regulamentação da inteligência artificial é um passo decisivo

Inteligência Artificial é uma das tecnologias mais fascinantes que vi em toda a minha vida, com o potencial de nos livrar do trabalho mais enfadonho, de nos permitir fazer em três dias o que hoje se fazia em cinco, ou até expandir o potencial do que o ser humano será capaz de conseguir. Mas, como qualquer tecnologia transformadora, a regulação é urgente e, incontornavelmente, lenta para o ritmo de inovação que a realidade impõe. No entanto, a União Europeia tem dado passos importantes para a utilização responsável da IA, que, não sendo suficiente, é um passo importante para o futuro.

Para as empresas, esta regulamentação fornece um quadro legal claro, reduzindo o espaço de “área cinzenta”e permitindo desenvolver e implementar soluções de IA com maior confiança. Desta forma, sabemos exatamente quais os limites e os requisitos éticos e legais que devem ser cumpridos por todos. Isto é crucial para fomentar a inovação responsável e garantir que os desenvolvimentos tecnológicos promovam o crescimento económico e, também, respeitem os direitos fundamentais dos indivíduos. Esta previsibilidade permite também que as empresas operem, agora, com maior segurança jurídica. Reduzem-se riscos associados à utilização de tecnologias que, até então, poderiam não estar completamente alinhadas com os valores éticos ou mesmo legais da sociedade. É um passo relevante para definirmos o que consideramos ou não aceitável.

A nova legislação europeia distingue entre áreas de alto, médio, baixo e quase nenhum risco, impondo regras específicas a cada uma delas, quer para utilizadores quer para fabricantes de tecnologia. A lei aborda, também, diretamente o receio da utilização da tecnologia contra os indivíduos. Por exemplo, será proibida a vigilância biométrica, com imposição de pesadas multas.

No âmbito do recrutamento, todas as empresas que recorrem à Inteligência artificial terão de declarar que a estão a utilizar. E como é que isso se faz? Apresentando registos detalhados – os chamados logs – que vão permitir entender as decisões dos algoritmos sobre determinados assuntos. Por exemplo, os critérios de exclusão de candidatos de um processo de seleção. Esta exigência por um maior nível de transparência contrasta com práticas de utilização da IA de forma menos clara e que podem levar a situações menos éticas, e reduz a possibilidade de um dia deixarmos que a IA tome decisões por nós, escolha por nós e se encarregue de nós.

A mudança rumo à transparência implica regulação, protegendo os humanos de usos indevidos e abusos, sublinhando que a IA deve servir-nos, e não o contrário. Penso que todos estaremos de acordo com esta premissa. O desafio levanta-se sobre o balanço entre restrições e inovação, onde qualquer aplicação da Lei não deve funcionar como um inibidor do progresso e da evolução, e, nesse sentido, a distinção entre desenvolvimento e inovação – como referiu Yuval Noah Harari – merece uma reflexão relevante..

Não tenho dúvidas de que a inteligência artificial generativa vai ser, já em 2024, uma das forças de mudança social. Assim, com a existência de normas claras pode ser que os consumidores vejam o uso de IA com maior confiança. E a lei que agora a regulamenta representa um passo fundamental para garantir que o desenvolvimento e implementação desta tecnologia revolucionária possam ser conduzidos de forma ética e responsável. Esta decisão do Parlamento Europeu é um marco importante para todos, marcando o início de uma nova era em que a inovação e a responsabilidade devem caminhar lado a lado.

 

 

Artigo publicado no Expresso, a 10 de abril de 2024.

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